quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Ivair Augusto dos Santos: racismo no Brasil não é criminalizado



Luciana Abade, Jornal do Brasil
BRASÍLIA – Os juristas brasileiros ignoram o crime de racismo. Por isso, a cada 17 denúncias de racismo, apenas uma vira ação penal no Brasil. Pior: no Rio, entre as que viram, 92% delas não são enquadradas como racismo, mas interpretadas, na esmagadora maioria dos casos, como injúria. A constatação é da tese de doutorado Direitos humanos e as práticas de racismo, defendida semana passada na Universidade de Brasília (UnB) pelo pesquisador Ivair Augusto dos Santos, que analisou processos e sentenças judiciais em 18 capitais brasileiras. De maneira geral, na maioria das vezes o crime de racismo é desconfigurado como tal, o que abranda a pena do agressor, que pode ter liberdade mediante fiança. O crime também deixa de ser imprescritível com a suavização da interpretação legal dos juízes.
– Minha pesquisa constata que há racismo institucional no Brasil – afirma Santos. – E, apesar da dificuldade em comparar, é fato que os danos do racismo institucional são enormes. Um exemplo é a polícia que sempre aborda primeiro o negro.
No Rio, o número de denúncias de racismo segue uma onda crescente. Foram 1.886 ações de racismo em 2005, 2.773 em 2006 e 1.549 no primeiro semestre de 2007. O número de processos no estado é consideravelmente superior aos dos outros estados. Entre 2003 e 2006, foram apenas 10 casos em Alagoas, por exemplo. Entre 2002 e 2007 Pernambuco registrou 63 casos e Rondônia teve 18 processos nesse mesmo período. Os números sobem na Região Sul. Foram 267 processos no Rio Grande do Sul e 837 em Santa Catarina.
“Permanecendo somente com os dados fornecidos pelo Tribunal de Justiça do Rio, revelou-se uma sociedade carioca que convive com milhares de situações de racismo no seu cotidiano e ignora, minimiza e acaba deixando uma lacuna ética, com efeitos perversos para o conjunto da população negra”, diz trecho do estudo. Segundo o pesquisador, os números de processos aumentam nas capitais onde há mais escolaridade porque pessoas instruídas tendem a lutar mais pelos seus direitos. No caso específico do Rio, além da alta escolaridade, Santos destaca a forte atuação do movimento negro.
O trabalho desenvolvido em 11 estados por organizações não governamentais que prestam assistência jurisdicional às vítimas de racismo foi a base da pesquisa de Santos. De acordo com essas ONGs, que atuam desde 1984, a tipificação do crime de racismo no Brasil é precária e inadequada e a população negra é tratada com descaso pelas autoridades policiais que não acreditam que possam ser punidas por não darem a pessoa negra o devido tratamento de cidadão.
Ainda segundo as ONGs, se a discriminação racial fosse objeto real de atenção judicial, diante de uma denúncia desse tipo caberia à parte acusada demonstrar a ausência de discriminação. Na fase do inquérito judicial, as ONGs constatam um despreparo dos delegados e demais policiais para investigarem este delito, previsto desde 1951 como contravenção penal.
Para o pesquisador, as dificuldades que a população negra enfrenta em acessar as instituições que compõem o sistema de Justiça decorrem de um conjunto de fatores econômicos, sociais e culturais. Por isso, quando o delegado, promotor ou juiz classifica uma ação penal de crime de racismo como injúria qualificada, os efeitos são imediatos para os cidadãos, pois uma ação pública passa ser uma ação privada, que exige a contratação de um advogado ou cai na dependência de um defensor público. E, “como a maioria da população negra se encontra entre os mais pobres da população brasileira”, boa parcela das vítimas não tem condições de pagar um advogado, explica Santos.
– É muito difícil provar a discriminação racial no Brasil porque quem tem que provar o dolo é a vítima – destaca o pesquisador. – E os juízes não veem o crime de racismo porque não aceitam o fato de que há racismo no país. Muitas vezes as agressões são entendidas como brincadeiras. Não existe a menor sensibilidade da Justiça para o quanto isso é doloroso para quem sofre o preconceito.
“Nega preta, fedida, fedorenta, macaca, passa-fome”, “retire-se daqui sua macaca”, “negro nojento, negro que tinha que ficar na chibata”, “negro safado, negro sem vergonha e sem futuro”, “serviço de gente e não serviço de preto e de porco”, “negro sujo e carniceiro ” e “preto que nasceu bom, nasceu morto” são apenas algumas expressões copiadas pelo pesquisador de processos de ações penais por racismo que não foram entendidas pelos juízes como tais. Foram interpretadas como injúrias e, às vezes, como simples brincadeira.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Manifesto em solidariedade aos mareenses


Leia e assine abaixo o "Manifesto em solidariedade ao povo da Maré", uma iniciativa da ONG Justiça Global:


A VIOLÊNCIA NA MARÉ - Confrontos armados, participação de policiais em ações do tráfico e descaso de autoridades refletem uma política de segurança que desconsidera a vida do morador da favela.

Na madrugada do dia 30 de maio de 2009, um grupo de traficantes da Baixa do Sapateiro iniciou a tentativa de tomar os pontos de vendas de drogas controlados por outra facção criminosa em uma comunidade vizinha, a Vila dos Pinheiros. Oito escolas e cinco creches ficaram fechadas por mais de uma semana, deixando cerca de 10 mil alunos sem aula. Desde então, moradores do conjunto de favelas da Maré vivem uma rotina de extrema violência que é muito pouco divulgada nos meios de comunicação. As autoridades, por sua vez, permanecem com uma postura que é de descaso e, diante do apoio de agentes do Estado nas ações criminosas, também de conivência.

Os confrontos armados são diários. O movimento do comércio é constantemente interrompido e há diversos relatos de casas invadidas, quedas de luz, além de um altíssimo número de mortos e feridos. Nos primeiros quinze dias de conflitos na Maré, em junho, quando a imprensa chegou a dar algum espaço para a situação vivida pelas comunidades, 19 mortes foram noticiadas. No entanto, um levantamento entre moradores aponta para mais de 50 mortes desde o início dos confrontos, há quase quatro meses. Segundo F.S.C., moradora do Morro do Timbau, as pessoas têm medo de sair de suas casas: “Passei uma semana sem poder ver meus pais, que moram na Vila do João. Minha mãe já ficou vários dias sem sair para trabalhar e às vezes tem que voltar no meio do caminho, pois os tiroteios recomeçam e ela fica exposta".

Um dos mais graves relatos aponta que policiais teriam participado da invasão à Vila dos Pinheiros. Moradores afirmam que três veículos blindados da Polícia Militar – os chamados 'caveirões' – foram ‘alugados’ para traficantes de uma das facções envolvidas. Na Maré, esta é uma informação naturalizada. “Todo mundo aqui sabe disso. Várias pessoas viram”, afirma R.A., morador do Conjunto Esperança.

A denúncia do aluguel de caveirões chegou até as autoridades e foi noticiada por um grande jornal do Rio de Janeiro, mas não foi suficiente para iniciar um debate amplo sobre a situação de extrema violência na Maré e sobre a responsabilidade do governo. Pelo contrário: assim que a notícia veio a público, a Secretaria de Segurança se apressou em desqualificá-la, em contradição evidente com falas anteriores do secretário José Mariano Beltrame, que por diversas vezes já havia ressaltado a importância de denúncias anônimas para as investigações policiais. Nem mesmo o novo comandante da Polícia Militar, Mario Sergio Duarte, que já esteve à frente do 22º Batalhão, arriscou um pronunciamento responsável.

A reação da cúpula da segurança do estado - negando os fatos antes de investigá-los - reflete a tônica deste governo: descaso com os relatos dos moradores das comunidades pobres e acobertamento de ações criminosas praticadas pela corporação policial. O silêncio do governador Sérgio Cabral é, indiscutivelmente, um reflexo dessa indiferença com que os governantes tratam os bairros pobres do Rio de Janeiro, mas pode esconder também uma estratégia perversa: a do “quanto pior, melhor”. Depois de meses de ausência deliberada, não seria surpresa se o Estado aparecesse na Maré vendendo como “solução” a realização de mais uma mega-operação policial – como a do Complexo do Alemão, que em 2007 levou o terror às comunidades e resultou na chacina de 19 pessoas em apenas um dia.

Em menos de quatro meses, entre maio e agosto daquele ano, foram registrados pelo menos 44 mortos e 81 feridos durante as incursões policiais no Alemão. Escolas e creches também foram fechadas, e os moradores ficaram sem poder sair de casa. Constata-se objetivamente que o efeito prático das ações policiais violentas do atual governo do Rio de Janeiro é o mesmo dos tiroteios entre traficantes: o desrespeito à vida e à liberdade do povo das favelas.

No último dia 12 de julho, o jornal O Globo publicou a matéria “Covil do Tráfico”, em que a cúpula da segurança do estado, ao apontar o Alemão como reduto importante do tráfico de drogas, reconhece a completa ineficácia da ação de dois anos atrás. No entanto, as autoridades prometem repetir as mega-operações policiais, até mesmo como pré-requisito para a implantação de um modelo que vem sendo vendido como novo paradigma na política de segurança do Rio de Janeiro e que ganha contornos eleitoreiros: a chamada política “de pacificação”.

Ao contrário do que é pintado no discurso oficial, as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) não rompem com a lógica das políticas de segurança que vêm sendo implementadas seguidamente pelos últimos governos. São diversos os casos documentados de agressão física e de abuso de autoridade envolvendo agentes das UPPs. Além disso, com base em conceitos higienistas e de superioridade de classe, proíbe-se arbitrariamente certas formas de organização social e cultural construídas historicamente nas favelas. Ou seja, a atuação da polícia permanece estruturada em uma relação tensa de controle e confronto com a população negra e pobre, com a restrição de liberdades e a imposição de uma autoridade baseada na coerção de suas armas. De fato, as diversas formas de violência policial são consequência da secular orientação ao militarismo e à brutalidade dentro de comunidades pobres.

Nos últimos anos, o Estado vem seguidamente realizando ações policiais violentas e desastrosas na Maré. Foram muitos casos emblemáticos, mas apenas alguns poucos se tornaram públicos. Em dezembro de 2008, o pequeno Matheus Rodrigues, de oito anos, morreu na porta da casa de sua mãe quando saía de casa para comprar pão e foi atingido no rosto por um tiro de fuzil disparado por policiais. Menos de cinco meses depois, em abril deste ano, o jovem Felipe Correia, de 17 anos, conversava com amigos há cerca de dez metros da casa de sua família. Quatro policiais militares sem uniforme dispararam apenas um tiro de fuzil, que acertou a cabeça do rapaz. Os dois crimes envolvem policiais do 22º Batalhão, o mesmo que é acusado de alugar o caveirão.

Casos como esses trazem a certeza de que o caminho para o fim do sofrimento dos moradores não pode, sob nenhuma hipótese, passar por operações policiais violentas. No último domingo, dia 20, um ato contra a violência reuniu 600 pessoas e percorreu as comunidades da Maré afetadas diretamente com os confrontos dos últimos meses. A manifestação, não à toa, foi realizada no dia em que o menino Matheus e o jovem Felipe fariam aniversário.

As organizações abaixo-assinadas se somam em solidariedade ao povo da Maré e reafirmam, categoricamente, que não aceitam mais uma política de segurança que encare a favela como território inimigo e que obedeça a uma lógica de exclusão, em que se governa apenas para alguns e se reserva a outros a violência da repressão, do controle e, frequentemente, do extermínio.


JUSTIÇA GLOBAL

domingo, 27 de setembro de 2009

Um universo em expansão: o poder, o capital e as guerras



Neste “universo em expansão” que nasceu na Europa, nunca houve nem haverá “paz perpétua”, nem “sistemas políticos internacionais” estáveis. Porque se trata de um “universo” que necessita da preparação para a guerra e das crises para se ordenar e se “estabilizar”. Foram quase sempre essas guerras e essas crises que abriram os caminhos da inovação e do “progresso”. Está em curso uma grande “explosão expansiva” do sistema inter-estatal capitalista e uma nova “corrida imperialista” entre as grandes potências, que deverão se intensificar nos próximos anos. O artigo é de José Luís Fiori, publicado no n° 5 do Jornal de Resenhas.
José Luís Fiori - Jornal de Resenhas


A recepção ao meu ensaio “O sistema inter-estatal capitalista, no início do século XXI”, publicado no livro "O mito do colapso do poder americano", atestou uma mesma dificuldade na compreensão do argumento sobre as relações entre o poder, o capital e as guerras dentro do sistema mundial. O artigo parte de uma hipótese central sobre o movimento de longo prazo do “sistema inter-estatal capitalista”, desde sua formação, na Europa, durante o “longo século XIII”, até o início do século XXI. Uma hipótese que permite compreender e diagnosticar a conjuntura internacional que estamos vivendo, desde a década de 1970.

Julgo possível identificar, nesta longa duração da história do sistema mundial, quatro momentos em que ocorreu uma espécie de “explosão expansiva”, no interior do próprio sistema. Nestes “momentos históricos”, houve primeiro um aumento da “pressão competitiva” dentro do “universo” e, depois, uma grande “explosão” ou alargamento de suas fronteiras internas e externas.

O aumento da “pressão competitiva” foi provocado – quase sempre – pelo expansionismo de uma ou várias “potências” líderes, e envolveu também um aumento do número, e da intensidade do conflito, entre as outras unidades políticas e econômicas do sistema. E a “explosão expansiva” que se seguiu projetou o poder dessas unidades ou “potências” mais competitivas para fora delas mesmas, ampliando as fronteiras do próprio “universo”.


Uma espécie de “big bang”“


A primeira vez que isso ocorreu, foi no “longo século XIII”, entre 1150 e 1350. O aumento da “pressão competitiva”, dentro da Europa, foi provocado pelas invasões mongóis, pelo expansionismo das Cruzadas e pela intensificação das guerras “internas”, na península ibérica, no norte da França, e na Itália. E a “explosão expansiva” que seguiu, se transformou numa espécie de “big bang” do “universo” de que estamos falando, o momento do nascimento do primeiro sistema europeu de “guerras e trocas”, com suas unidades territoriais soberanas e competitivas, cada uma delas, com suas moedas e tributos. A segunda vez que isto ocorreu foi no “longo século XVI”, entre 1450 e 1650. O aumento da “pressão competitiva” foi provocado pelo expansionismo do Império Otomano e do Império Habsburgo e ainda pelas guerras da Espanha, com a França, com os Países Baixos e com a Inglaterra. É o momento em que nasceram os primeiros Estados europeus, com suas economias nacionais e com uma capacidade bélica muito superior à das unidades soberanas do período anterior.

Foi a “explosão expansiva” deste embrião do sistema inter-estatal europeu – para fora da própria Europa – que deu origem ao “sistema mundial moderno”, liderado, inicialmente, pelas potências ibéricas e, depois, pela Holanda, França e Inglaterra. A terceira vez foi no “longo século XIX”, entre 1790 e 1914. O aumento da “pressão competitiva” foi provocado pelo expansionismo francês e inglês, dentro e fora da Europa, pelo nascimento dos Estados americanos e pelo surgimento, depois de 1860, de três potências políticas e econômicas – EUA, Alemanha e Japão – que cresceram muito rapidamente, revolucionando a economia capitalista e o “núcleo central” das grandes potências.

Logo em seguida, houve uma terceira “explosão expansiva” que assumiu a forma de uma “corrida imperialista” entre as grandes potências, que trouxe a África e a Ásia para dentro das fronteiras coloniais do “sistema mundial moderno”. Por fim, desde a década de 1970, está em curso uma quarta ‘explosão expansiva’ do sistema mundial. Nossa hipótese é que, desta vez, o aumento da pressão dentro do sistema mundial está sendo provocado pela estratégia expansionista e imperial dos EUA, depois dos anos 70, pela multiplicação dos Estados soberanos do sistema, que já são cerca de 200, e, finalmente, pelo crescimento vertiginoso do poder e da riqueza dos estados asiáticos, e da China, muito em particular” (1).

Minha pesquisa sobre as relações entre a geopolítica e a geo-economia do sistema mundial começou há mais de 20, com o estudo da “crise dos anos 1970” e a “restauração liberal-conservadora” da década de 1980 e seguiu com o acompanhamento das transformações internacionais das décadas seguintes.

A impossibilidade de entender esta conjuntura a partir de si mesma me levou a uma longa viagem no tempo, até as origens do “sistema inter-estatal capitalista”, procurando entender suas tendências de longo prazo. Comecei pelas “guerras de conquista” e pela “revolução comercial” que ocorreram na Europa nos séculos XII e XIII, para chegar até a formação dos Estados e das economias nacionais européias e o início de sua vitoriosa expansão mundial, a partir do século XVI.Na Europa, ao contrário do que aconteceu nos impérios asiáticos, a desintegração do Império Romano e, depois, do Império de Carlos Magno provocou uma fragmentação do poder territorial e um desaparecimento quase completo, entre os séculos IX e XI, da moeda e da economia de mercado.

Nos dois séculos seguintes, entretanto – entre 1150 e 1350 –, aconteceu a grande revolução que mudou a história da Europa, e do mundo: foi naquele período que se forjou no continente europeu uma associação indissolúvel e expansiva entre a “necessidade da conquista” e a “necessidade de produzir excedentes” cada vez maiores, que se repetiu, da mesma forma, em várias unidades territoriais soberanas e competitivas, que foram obrigadas a desenvolver sistemas de tributação e criar suas próprias moedas, para financiar suas guerras de conquista. As guerras e os tributos, as moedas e o comércio, existiram sempre, em todos os tempos e lugares, a grande novidade européia foi a forma como combinaram, somaram e multiplicaram em conjunto, dentro de pequenos territórios altamente competitivos, e em estado de permanente preparação para a guerra.


Circuito acumulativo


A preparação para a guerra e as guerras propriamente ditas, na Europa, transformaram-se na principal atividade de todos os seus “príncipes”, e a necessidade de financiamento dessas guerras se transformou num multiplicador contínuo da dívida pública e dos tributos. E, por derivação, num multiplicador do excedente e do comércio, e também do mercado de moedas e de títulos da dívida, produzindo e alimentando – dentro do continente – um “circuito acumulativo” absolutamente original entre os processos de acumulação de poder e de riqueza.

Não há como explicar o aparecimento desta “necessidade européia” da “acumulação do poder” e do “excedente produtivo” apenas a partir do “mercado mundial” ou do “jogo das trocas”. Mesmo que os homens tivessem uma propensão natural para trocar – como pensava Adam Smith -, isso não implicaria necessariamente que eles também tivessem uma propensão natural para acumular lucro, riqueza e capital. Porque não existe nenhum “fator intrínseco” à troca e ao mercado que explique a necessidade “compulsiva” de produzir e acumular excedentes.

Ou seja, a força expansiva que acelerou o crescimento dos mercados e produziu as primeiras formas de acumulação capitalista não pode ter vindo do “jogo das trocas”, ou do próprio mercado, nem veio, nesse primeiro momento, do assalariamento da força de trabalho. Veio do mundo do poder e da conquista, do impulso gerado pela “acumulação do poder”, mesmo no caso das grandes repúblicas mercantis italianas, como Veneza e Gênova.

Pois bem, do meu ponto de vista, o conceito de poder político tem mais a ver com a idéia de fluxo do que com a de estoque. O exercício do poder requer instrumentos materiais e ideológicos, mas o essencial é que o poder é uma relação social assimétrica indissolúvel, que só existe quando é exercido; e, para ser exercido, precisa se reproduzir e acumular constantemente.

A “conquista”, como disse Maquiavel, é o ato fundador que instaura e acumula o poder, e ninguém pode conquistar nada sem ter poder, e sem ter mais poder do que o que for conquistado. Num mundo em que todos tivessem o mesmo poder, não haveria poder. Por isso, o poder exerce uma “pressão competitiva” sobre si mesmo, e não existe nenhuma relação social anterior ao próprio poder.


Capital, poder e guerra


Além disto, como a guerra é o instrumento em última instância da conquista e da acumulação de poder, ela se transformou num elemento co-constitutivo deste sistema de poderes territoriais que nasceu na Europa, e que depois se expandiu pelo mundo. Por isso, a origem histórica do capital e do sistema capitalista europeu é indissociável do poder político e das guerras, e a teoria sobre a formação deste “universo europeu” tem que começar pelo poder e pelas suas guerras, pelos tributos e pelo excedente, e por sua transformação em dinheiro e em capital, sob a batuta do poder dos “soberanos”.

O “fator endógeno” ou “primeiro princípio” que move este universo é exatamente esta força da compulsão sistêmica e competitiva que leva à acumulação sem fim do poder e do capital. E, do meu ponto de vista, o poder tem precedência lógica, dentro dessa relação simbiótica, a despeito de que a “acumulação de capital” tenha adquirido uma “autonomia relativa” cada vez mais extensa e complexa, com o passar dos séculos.

Mais tarde, depois do “longo século XVI” e da formação na Europa dos seus primeiros Estados nacionais, estas mesmas regras e alianças fundamentais, que haviam se estabelecido no período anterior, se mantiveram. Com a diferença de que, no novo sistema de competição, as unidades envolvidas eram grandes territórios e economias articulados num mesmo bloco nacional, e com as mesmas ambições expansivas e imperialistas. O objetivo da conquista não era mais a destruição ou ocupação territorial de outro Estado, poderia ser apenas sua submissão econômica. Mas a conquista e a monopolização de novas posições de poder político e econômico seguiu sendo a mola propulsora do novo sistema.

No novo sistema inter-estatal, a produção do excedente e os capitais de cada país passaram a ser uma condição indispensável de seu poder internacional. E foi dentro dessas unidades territoriais expansivas que se forjou o “regime de produção capitalista”, que se internacionalizou de mãos dadas com estes novos impérios globais criados pela conquista destes primeiros Estados europeus.

E, depois do século XVI, foram sempre estes Estados expansivos e ganhadores que também lideraram a acumulação de capital, em escala mundial. Além disso, a chamada “moeda internacional” sempre foi a moeda desses Estados e dessas economias nacionais mais poderosas, transformando-se num dos principais instrumentos estratégicos, na luta pelo poder global.

A expansão competitiva dos “Estados-economias nacionais” europeus criou impérios coloniais e internacionalizou a economia capitalista, mas nem os impérios, nem o “capital internacional” eliminaram os Estados e as economias nacionais. Neste novo sistema inter-estatal, os Estados que se expandiam e conquistavam ou submetiam novos territórios também expandiam seu “território monetário” e internacionalizavam seus capitais. Mas, ao mesmo tempo, seus capitais só puderam se internacionalizar na medida em que mantiveram seu vínculo com alguma moeda nacional, a sua própria ou a de um Estado nacional mais poderoso.

Por isso, pode-se dizer que a globalização econômica sempre existiu e nunca foi uma obra do “capital em geral”, nem levará jamais ao fim das economias nacionais. Porque, de fato, a própria globalização resulta da expansão vitoriosa dos “Estados-economias nacionais” que conseguiram impor seu poder de comando sobre um território econômico supranacional cada vez mais amplo, junto com sua moeda, sua dívida pública, seu sistema de crédito, seu capital financeiro e suas várias formas indiretas de tributação.


Potência autodestrutiva


Do mesmo modo, qualquer forma de “governo mundial’ é sempre uma expressão do poder da potência ou das potências que “lideram” o sistema inter-estatal capitalista. Muitos autores falam em “hegemonia” para referir-se à função estabilizadora desse líder dentro do núcleo central do sistema. Mas esses autores não percebem – em geral – que a existência dessa liderança ou hegemonia não interrompe o expansionismo dos demais Estados, nem muito menos o expansionismo do próprio líder ou hegemon.

Por isso, toda potência hegemônica é sempre, ao mesmo tempo, autodestrutiva, porque o próprio hegemon acaba desrespeitando as regras e instituições que ajudou a criar para poder seguir acumulando seu próprio poder, como se pode ver no caso americano, depois do fim da Guerra Fria. Donde é logicamente impossível que algum país “hegemônico” possa vir a estabilizar o sistema mundial, como pensam vários analistas.

Neste “universo em expansão” que nasceu na Europa, durante o “longo século XIII”, nunca houve nem haverá “paz perpétua”, nem “sistemas políticos internacionais” estáveis. Porque se trata de um “universo” que necessita da preparação para a guerra e das crises para se ordenar e se “estabilizar”. Foram quase sempre essas guerras e essas crises que abriram os caminhos da inovação e do “progresso”, na história desse sistema inventado pelos europeus. É a partir dessa compreensão do sistema mundial, e não assentado apenas em opiniões e vaticínios, que fundamento minha avaliação sobre o “mito do colapso americano”. A mesma visão que me autoriza a pensar que os fracassos político-militares norte-americanos, no início do século XXI, e a atual crise econômica mundial não apontam para o fim do “modo de produção capitalista”, nem para uma “sucessão chinesa” na liderança mundial, que deverá seguir nas mãos dos EUA.

O que não quer dizer, obviamente, que a liderança americana seja definitiva ou que o sistema mundial não esteja vivendo uma transformação gigantesca. Como já disse no início deste artigo: do meu ponto de vista, está em curso uma grande “explosão expansiva” do sistema inter-estatal capitalista e uma nova “corrida imperialista” entre as grandes potências, que deverão se intensificar nos próximos anos. Este não é um mundo “sombrio”, como pensam alguns, é apenas o mundo em que nascemos.


Nota(1) FIORI, José Luís - “O sistema inter-estatal capitalista no início do século XXI”, in: O mito do colapso do poder americano. Rio de Janeiro, Record, 2008, p. 22 e 23.


Postado Originalmente em Carta Maior

sábado, 26 de setembro de 2009

Zelaya retorna à Honduras e se refugia na embaixada brasileira


Na manhã desta segunda-feira (21/09), o presidente legítimo de Honduras Manuel Zelaya chegou em Tegucigalpa (capital), e está refugiado na embaixada brasileira. Zelaya viajou por 2 dias com 4 homens por terra, cruzando montanhas e rios até chegar na embaixada. No dia 28 de Junho Zelaya foi expulso do país pelos militares que estabeleceram uma ditadura violenta comandada pelo presidente golpista Micheletti, as forças armadas e a elite do país. Desde então o povo hondurenho vem manifestando todos os dias contra o golpe, que já contam com mais de 85 dias de protestos e resistência.

Na medida em que a notícia foi sendo confirmada e se espalhando, a populacão saiu às ruas e foi encontrar o presidente na embaixada brasileira. A Guarda Nacional cercou a embaixada tentando conter a manifestacão. À tarde já estavam cerca de 5 mil pessoas no local e pessoas de todos os lugares do país já estão a caminho. Zelaya pediu ao governo golpista que devolva o governo de forma pacífica. Durante todo o dia um helicóptero do servico secreto do governo golpista sobrevoou a embaixada e há um número grande de soldados e policiais que chegaram a reprimir a população em alguns momentos. NarcoNews, site de jornalismo investigativo com uma equipe de cobertura em Honduras desde os primeiros dias do golpe, noticiou que o sinal de celular e a conexão de internet foram cortados na capital durante parte da manhã.

Atualizações:: Na manhã desta terça-feira, a polícia e exército hondurenhos atacaram os manifestantes que estavam próximos à embaixada do Brasil. Os aeroportos de Honduras também foram fechados pelo governo golpista de Roberto Michelleti. O governo golpista cortou água e energia da embaixada e está impedindo a entrada de alimentos. Há relatos de pelo menos duas pessoas mortas, dezenas de feridos e presos.

O movimento de resistência contra o golpe, ao longo dos quase três meses de luta, cresceu e está indo além de exigir a volta de Zelaya. O movimento de resistência passou a ser um conjunto de sindicatos, movimentos e organizações de todo o país. Em suas assembléias já se colocam coisas além da queda de Micheletti e retorno de Zelaya, a começar por exigir uma Assembléia Constituinte. A ditadura de Micheleti parece ter despertado ainda mais a participação política. O povo adquiriu experiência organizativa e começam a se dar novas formas de organização independente dos partidos políticos existentes e com raízes nas bases da sociedade, o que garante sua permanência.

O Ministro de Relacões Exteriores do Brasil, Celso Amorim, em seu discurso na Assembléia Geral da ONU, disse que "Esperamos que isso irá abrir uma nova etapa nas discussões e que uma solucão rápida, com base no direito constitucional, possa ser alcancada". De acordo com Amorim o presidente Zelaya pediu permissão para entrar na embaixada uma hora antes de sua chegada no local e que o Brasil não teve nenhum envolvimento com a forma em que o presidente ingressou no país."O presidente disse que chegou a Honduras por meios próprios e pacíficos", explicou Amorim.

Zelaya declarou que possui o apoio da ONU, OEA, de líderes de países da América Latina e também da União Européia. Uma reunião de emergência foi feita hoje pela OEA para elaborar uma proposta para a restituicão da democracia em Honduras.

Micheletti negou no começo do dia que Zelaya estava em Honduras. Em entrevista, ele declarou que Zelaya não estava em Honduras, mas sim em um hotel na Nicaragua. Depois de uma entrevista ao vivo por telefone, o canal de TV Telesur conseguiu imagens através de uma transmissão via internet de Zelaya na embaixada e saindo para comprimentar o povo, prova concreta de que o presidente está no país.


Fonte - CMI Brasil

terça-feira, 22 de setembro de 2009

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Mapuches no Chile continuam a ser perseguidos/as pelo governo de Bachelet


Vozes de várias organizações, coletivos e setores da sociedade chilena denunciam a continuidade das perseguições políticas e crimes de Estado contra o povo mapuche, praticadas nesse governo atual, de Michele Bachelet. Esse governo tem sido comparado ao governo do ditador Pinochet, principalmente pela constante e impune violência policial (que inclui casos frequentes de tortura para arrancar confissões falsas) e ampla repressão direcionada às manifestações mapuches, incluindo aquelas em solidaridade.
No dia 18 de agosto, 7 presos/as políticos/as iniciaram uma greve de fome com o objetivo de nao serem tranferidos/as arbitrariamente para outras prisões, longe de suas familias e organizações. A greve foi acompanhada por outras pessoas solidárias a luta mapuche que acampavam fora do presidio El Manzano em Concepción e durou até o dia 4 de setembro, quando finalmente a tranferência foi suspensa.
A principal reinvindicação mapuche é a recuperação e auto-gestão de seus territórios ancestrais, em outras palavras, auto-determinação de seu povo - direito inclusive amplamente amparado por jurisprudência internacional (Declaracao sobre os Direitos dos Povos Indigenas, das Nacoes Unidas, Convencao 169 da OIT). Interessa mencionar que, em setembro de 2008, a presidenta Bachelet ratificou a convencao 169 da OIT, demanda historia do movimento indígena, que entraria em vigor dia 15 de setembro desse ano (2009).
A pesar disso, por meio de uma lei ?anti-terrorista? absurda herdada da ditadura de Pinochet, muitos/as mapuches foram presos/as e permanecem encarcerados/as. Dita lei faz parte do pacote para criminalizar movimentos sociais. Considera-se terrorista toda forma de resistência contra a ordem dominante, capitalista, neocolonial, branca, neoliberal e fascista, independentemente de se realiza atentados contra a população civil, como se define internacionalmente. É obvio que as organizações mapuches nunca estiveram envolvidas em nenhum atentado contra civis. Lideranças mapuches foram presas por participarem de protestos ou organizações indígenas que lutam por algo que lhes é devido, historicamente: suas terras.
Além da prisão, sao relatadas torturas policiais com o objetivo de arrancarem confissões diversas, em geral, de haverem agredido policiais, como é o caso do estudante Jonathan Huillical (24), que forma parte de uma rede de apoio a comunidades mapuche detido no dia 14 de abril.
No comeco de agosto (2009), Jaime Mendonza, ativista mapuche, foi assassinado pela policía com um tiro nas costas, na região de la Araucanía. O policial Miguel Jara Muñoz, responsável pelo tiro que matou Jaime foi liberado sob fiança pela corte marcial.
No dia internacional da mulher indígena (5 de setembro), policiais invadiram o territorio Trapilhue Mahuidache, a 15 quilômetros de Temuco, agrediram e prenderam as ñaña (mulheres mapuches) Inicha Curín, Clorinda y Bernardita Neculmán, Rita Ancao y Mercedes Loncón, entre as quais Inicha, de 85 anos de idade, foi golpeada e arrastada no chao.
É muito importante, que nesse momento, estejamos todos/as em alerta acompanhando as informações enviadas pelos meios de comunicação mapuches.


Retirado do CMI Brasil

domingo, 20 de setembro de 2009

sábado, 19 de setembro de 2009

Entrevista de Januário Santana no SBT

Manifestantes protestam no Carrefour contra agressão racista


Por: Redação - Fonte: Afropress: Foto - Frente 3 de Fevereiro - 22/8/2009

S. Paulo - Não foi de nenhuma entidade do Movimento Negro de S. Paulo, mas de um coletivo composto por estudantes e profissionais liberais - a Frente 3 de Fevereiro - a iniciativa de promover a primeira manifestação pública para protestar, em frente ao Carrefour, contra a violência racista sofrida pelo funcionário da USP, Januário Alves de Santana, o homem negro espancado por cinco seguranças, depois de ser tomado por suspeito do roubo do seu próprio carro – um EcoSport.

Munidos de indignação e dispostos a "fazer alguma coisa" a Frente 3 de Fevereiro conseguiu reunir 10 carros com ativistas que saíram na manhã deste sábado (22/08) da Praça Pan Americana, zona Oeste de S. Paulo, até a Avenida dos Autonomistas, em Osasco. Em cada carro, uma placa com a inscrição “Carrefour Racista”.

Além da placa, já no estacionamento, eles montaram uma performance e ligaram sirenes com a locução: “Atenção. Sou Negro e este carro não está sendo roubado”. Assustada uma senhora que se apresentou como Regina, porta-voz do Carrefour, acompanhou a movimentação, enquanto os ativistas procuravam pela “salinha”, onde Januário foi espancado barbaramente durante quase 30 minutos pelos seguranças.

O local do crime

Chegaram até uma salinha de vidro, onde alguns homens não quiseram se identificar nem responderam a tentativa de contato, e souberam por informações que, provavelmente foi no local – antes protegido por uma tela escura de insufilme - que ocorreu o espancamento na noite do dia 07 de agosto.

Uma viatura da Polícia Militar foi chamada, porém, a representante do hipermercado, informou que a viatura estava apenas fazendo ronda. Segundo Felipe Teixeira Gonçalves, a informação seria desmentida pelos próprios policiais que disseram terem sido chamados.

Onde estão os negros?

No final estenderam uma enorme bandeira com a inscrição “Onde estão os Negros” e distribuíram panfletos com o título “Carrefour Racista - Frente 3 de Fevereiro convoca para a Ação" - e o texto com um alerta para os negros: Ao escutarem um alarme tocar ou receberem alguma movimentação estranha em locais públicos:1) Não entre em seu carro, não corra;2) Disfarce automaticamente para não ser confundido;3) Entre em alguma loja, comece a conversar com alguém do seu lado;4) Atenda o celular, mesmo que não esteja tocando;5) Não chame a polícia e nem fique por perto do segurança do local; 6) Evite ficar perto de outro negro, juntos são suspeitos de formação de quadrilha.

Flávio Santana

A Frente surgiu depois do assassinato do dentista Flávio Santana, morto por policiais militares, no dia 03 de fevereiro, ao ser confundido com um assaltante, ao retornar do Aeroporto de Cumbica, onde fora levar a namorada suíça que embarcava de volta ao seu país.

“Nossa proposta é utilizar intervenções urbanas, artísticas e políticas para discutir o racismo na sociedade brasileira porque entendemos que o problema do racismo não é só dos negros é da sociedade como um todo”, afirmou Gonçalves, um dos líderes do protesto.

Segundo Gonçalves, na próxima semana, a Frente vai fazer contato com os advogados de Januário para discutir uma estratégia de ações públicas que evitem o esquecimento do caso.
Na próxima terça-feira, (25/08) às 15h, está marcado o depoimento de Santana no 9º DP de Osasco.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A direita tem sim candidato em 2010. E seu nome é José Serra


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez nesta quarta-feira (16) comentários sobre as eleições de 2010 que alimentam os argumentos daqueles que insistem na tese furada de que não há mais diferenciações entre "esquerda" e "direita". O presidente comemorou a possibilidade de as eleições de 2010 não terem nenhum representante de pensamentos "trogloditas de direita".

"Vai ser uma campanha que vai ter um nível muito melhor. E pela primeira vez não vamos ter um candidato de direita na campanha", observou o presidente, ao participar de cerimônia em comemoração pelos 45 anos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

"Se tiver quatro ou cinco candidatos, são todos do espectro de esquerda", raciocinou o presidente, provavelmente referindo-se às candidaturas de Marina Silva (PV), Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB), Ciro Gomes (PSB) e Heloisa Helena (PSOL). "Uns podem não ser mais tão de esquerda quanto eram, mas não tem problema. A história e a origem dão credibilidade para o presente das pessoas", complementou Lula.

As declarações do presidentre ignoram o fato de que o PSDB é, hoje, o que os analistas qualificam como a "expressão orgânica da direita 'moderna'", hegemonizada não mais pelos coronéis do interior, mas principalmente pela elite financista e os setores reacionários da classe média urbana que encarnam o pensamento liberal-conservador e veem a desigualdade social como mera consequência da meritocracia.

Os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso e os atuais governos de José Serra, em São Paulo; Aécio Neves em Minas Gerais; e Yeda Crusius no Rio Grande do Sul, deixam claro que o jeito tucano de governar é fortemente marcado pela fragilização do papel do Estado, sobretudo através das privatizações de estatais e terceirização de serviços públicos; pelo ataque aos direitos trabalhistas; pela falta de diálogo com a sociedade e pela criminalização dos movimentos sociais; pela concessão de privilégios ao setor rentista em detrimento do setor produtivo. Direitos essenciais como educação, saúde, transporte, habitação e cultura são ora tratados como pura mercadoria, ora relegados a fim da lista de prioridades. Em suma, a análise da prática governamental do tucanato, em aliança umbilical com o ex-PFL, atual DEM, em nada lembra a social-democracia à qual o PSDB um dia sonhou representar, e está muito mais para uma democracia liberal elitista. Neoliberal e privatista, num jargão mais ontemporâneo.

As declarações de Lula sobre o perfil das candidaturas em 2010 surpreendem negativamente sobretudo após o enfático discurso que o presidente fez ao lançar os projetos de marco regulatório do pré-sal. Naquele discurso, Lula fez questão de demarcar campo com o governo que o antecedeu e, mesmo sem citar nomes, lembrou que no governo FHC "os adoradores do mercado estavam em alta e tudo que se referisse à presença do Estado na economia estava em baixa". Disse ainda que naqueles tempos o Brasil era governado por "exterminadores do futuro", com "pensamento subalterno" e que o país tinha deixado de acreditar em si mesmo.

Estes "exterminadores do futuro" aos quais Lula se referiu são os mesmos que sonham retornar ao poder num eventual governo Serra.

A disputa de 2010 não está ganha e não será fácil. A oposição de direita, em aliança com a massacrante máquina de propaganda da mídia, jogará pesado para tentar retomar o controle do Estado. Não dá para alimentar ilusões. Declarações conciliatórias como a do presidente Lula, que ameniza o perigo que a candidatura tucana representa para o futuro do país, não ajudam em nada no esforço das forças progressistas para manter o Brasil no rumo do desenvolvimento com soberania e justiça social.
Retirado do site www.vermelho.org.br

terça-feira, 15 de setembro de 2009

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

domingo, 6 de setembro de 2009

70 dias de resistência popular contra o Golpe em Honduras




Nas ruas de Tegucigalpa, capital do país, e também pelo interior, todos os dias milhares de pessoas vão às ruas exigir a saída de Roberto Michelleti, presidente imposto através de um golpe militar que expulsou violentamente do país o presidente legítimo Manuel Zelaya (veja fotos dos dias de resistência no CMI Honduras). O povo hondurenho mostra força de luta e solidariedade, caminhando kilômetros à pé, passando de cidade em cidade. A resistência segue até os pontos principais do país e, pelo caminho, são recebidos/as pelas pessoas que saem de suas casas dando-lhes água, comida e tudo o que é possível oferecer para que possam seguir marchando e resistindo.
Junto com as marchas, os bloqueios de estradas impedem que mercadorias circulem pelo país, dificultando que o governo golpista consiga estabilizar a economia. Os/as professores/as, que são praticamente a coluna vertebral da resistência, foram os primeiros a chamar as manifestações contra o Golpe e combinaram com pais e mães dos/as alunos/as, que durante as semanas irão dar aulas com carga horária maior durante dois ou três dias e nos outros irão para as marchas. Agora, o governo golpista tenta frear esta parte forte da resistência cortando os salários dos/as professores/as. Todos os dias há alguma ação contra o Golpe, desde greves, festivais de músicas com artistas de toda a América Latina até caravanas e eventos/encontros internacionais com movimentos de todas as partes do mundo.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009