sábado, 13 de novembro de 2010

QUAL É A CARA DO BRASIL? Texto do amigo Rafael Peçanha

QUAL É A CARA DO BRASIL?



O Estado de São Paulo elegeu como Deputado Federal um dos recordistas de votos na história do nosso país – o palhaço Tiririca. Nesta quinta-feira, após acusações de que teria falsificado o documento que comprovava sua habilitação ao cargo (ou seja, uma carta de próprio cunho, que atestava sua alfabetização), o palhaço teria se livrado da denúncia por conseguir interpretar uma notícia de jornal e ter realizado um ditado a partir de uma obra literária.
Ainda que o TSE não tenha decidido de forma definitiva a questão até o fechamento deste texto, cabem algumas considerações interessantes.
Primeiro, discutir a idéia do analfabetismo como crivo para candidaturas. Não vejo um preconceito nesse ponto da legislação eleitoral, ainda que tenha a certeza de que muitos cidadãos analfabetos fariam um trabalho infinitamente melhor do que os “letrados” eleitos deste país. Entretanto, cabe lembrar que, tendo a necessidade de assessoria para redação de documentos e assinatura dos mesmos, teríamos aí um risco de engano e fraude muito grande em um mandato político – risco que também temos, mas em menor escala, nos mandatos ditos “alfabetizados”.
Segundo, observemos que, no Brasil inteiro, o caso de Tiririca é o único do qual temos notícia sobre suspeitas de fraude em documentos comprobatórios de escolaridade. Terá sido mesmo o único da nação? Ou será que a investigação foi motivada pelo resultado da eleição?
Terceiro e mais importante: tenho visto nos noticiários – especialmente na televisão – a defesa do palhaço por entrevistados, analistas e jornalistas exaltados: “a vontade do povo tem que ser respeitada” ou ainda “ele é a cara do Brasil” ou até “ele é do povo” são as frases corriqueiras.
Tiririca não foi eleito porque é do povo, porque é pobre ou analfabeto, nem porque é uma pessoa simples. Ele não foi eleito por nenhum desses motivos piegas e sentimentais, que revelariam um voto paulista “disposto a fazer justiça social”. Tiririca não é do povo – ele é da mídia. Tiririca é o voto de um eleitorado acostumado a eleger “famosos” para cargos públicos.
O voto em Tiririca, por outro lado, não é um voto de protesto – é o voto de quem não se importa com o processo eleitoral e prefere votar em candidatos legais, simpáticos, que façam rir.
O discurso pode ser de protesto e bondade, mas o sentimento é de descaso e louvor à mídia. Dos problemas brasileiros, o analfabetismo político parece ser tão destrutivo quanto o analfabetismo funcional. Afinal Qual é a cara do Brasil?

Nenhum comentário: