Por Fábio Emecê
Bem, lendo a última coluna do Anderson Macleyves, publicado no jornal “O Completo” e de inúmeras colocações expostas, o termo “Autopreconceito” realmente me incomodou. Incomodou a tal ponto de eu me propor a elucidar os argumentos colocados a partir da visão de um militante.
Para começar, o racismo não é um sentimento, não é algo que brota de dentro da pessoa. É uma teoria ideológica com viés político, tendo como base os impulsos imperialistas das nações européias. É a ideia de que com um biotipo x que produz cultura y é superior aos demais biotipos e culturas.
O conceito de raça tomou corpo a partir de 1800, tendo como base as incursões dos europeus em África. Para justificar a dominação do ponto de vista científico, foram elaborados teses a partir do tamanho do crânio, sangue, comparação de culturas e cor da pele.
Evocando Deus ou a ciência, o europeu tentava justificar a usurpação das riquezas, a matança indiscriminada, a escravização e comércio dos africanos. O racionalismo europeu fervia com suas teses que diziam que os negros eram inocentes, sensuais, primitivos, com baixa capacidade intelectual, sem alma, fisicamente propensos ao trabalho compulsório e sexualmente desregrados.
Ah, o Brasil aboliu a escravatura, certo? Em 1888 na capital do Império, em uma população de mais ou menos 200 mil negros, apenas 5 mil eram escravos. Sem contar que a mão de obra especializada ou não, eram feitas em sua maioria por negros. De carregadores de fezes a tipógrafos.
Bondade de Isabel então? A Inglaterra pressionou por causa da expansão de mercado e outra, a elite brasileira estava com medo de que o Brasil se torna-se um novo Haiti, ainda mais com os constantes levantes e saques as fazendas.
Vale ressaltar que o escravo que era classificado como objeto, mercadoria e abolição traria o ônus da humanização para o Estado Brasileiro. Houve esforços para garantir essa humanização?
Vamos tentar entender os argumentos do Macleyves, primeiro com relação ao casamento inter-racial e o cabelo afro x alisamento.
Entender esse processo é entender as relações de dominação. Se temos um grupo com um biotipo e cultura dominantes, para que esse domínio tenha êxito, o dominado tem que acreditar no ideal de biotipo e cultura. Escolher uma loira ou alisar o cabelo pode ser considerado uma tentativa de adesão a cultura dominante.
Uma questão: questionar a escolha afetiva ou estética passa a ter sentido quando você faz parte de um movimento de reinvidicação ou não?
Com relação aos negros ricos não falarem com negros pobres. Ora, os ricos brasileiros não são caracterizados como pessoas que andam, frequentam, dialogam e casam com pobres. Nem em novela isso rola. Se tivesse essa parcimônia toda, o Brasil não seria campeão em carros blindados, muito menos não existiriam condomínios com muros altos, câmeras e cercas elétricas. Questionamento chulo, diria.
Com relação as cotas e acões afirmativas, sabe qual foi a primeira grande ação afirmativa do Estado Brasileiro? Trazer imigrantes europeus para ocupar a suposta carência de mão de obra pós abolição. A mão de obra especializada já existia, afinal os negros trabalhavam em todas as esferas. Ah, sabe com que recursos trouxeram os europeus? Com a cota de impostos que os traficantes de escravos pagavam ao Império.
Por que o espanto com relação as ações afirmativas? Para me mostrar capaz, tenho que ter espaço e quando o Estado Brasileiro acena para essa possibilidade de garantia de espaço, não pode porque demonstra que os negros são incapazes. Sem espaço que somos incapazes, cara pálida.
Em um momento histórico de embate, seja de classes, ideológico, de forças, em uma estrutura que não há garantias de direitos básicos, o movimento reivindicatório é mais do que legitímo. Em um país de origem escravocrata, de formação republicana pautada no racionalismo europeu, ter um movimento negro é no mínimo plausível.
A questão da desigualdade social x desigualdade racial, o que me incomoda é os termos não são opostos, pelo menos em países de origem escravocrata, não o são. Os antigos escravos e seus descendentes automaticamente são pobres e miseráveis em um Estado que nunca se preocupou em inseri-los ao acesso dos recursos materias produzidos. Alías, a imigração européia justamente retirou os negros dos postos de trabalho e o termo vadiagem, só para se ter uma noção foi usado a partir do momento em que os negros estão sem emprego, sem moradia, sem utilidade. E o que foi sedimentado para controlar esses negros? A Polícia Militar.
Os negros deixando de ser pobres e miseráveis, o racismo acaba? Lembro do relato do Professor Doutor Joel Rufino dos Santos, que apesar de sua graduação, ainda olhavam para ele como o ser potente sexual, sexualmente desregrado.
Existe um esforço separatista por parte dos negros militantes? O chamado “Autopreconceito”. Dizer isso em uma sociedade racista é a lógica de dizer que o oprimido é culpado pela violência do opressor pelo simples fato de estar no lugar errado, na hora errada.
Ter igualdade, paz e união é um anseio da humanidade, mas temos que ter acumulo teórico e prático para entender que estamos bem longe das flores e admitir isso é o processo histórico e ideológico no qual estamos inseridos.
Estamos aqui para combater, para questionar e se libertar de todas as formas de opressão. O combate ao racismo está na pauta. Está...
Um comentário:
Perfeito! E ainda concluo dizendo que quem escreve mais de um parágrafo sobre as questões de preconceito seja de qual gênero for e tem a terrível prática do copia e cola, acaba pegando um pensamento solto do outro e ao desdobrá-lo transparece os seus próprios conceitos. O artigo em pauta está cheio disso: cita um pensamento libertário e se trai nas considerações. Para quem se diz de teatro e não consegue nem ver o subtexto do que escreve, é no mínimo patético. E olha que o mergulho no subtexto é um dos estudos primordiais do teatro.
Resultado, ficou o pensamento que ele não queria, mas não adianta. Tá dentro...
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