domingo, 7 de fevereiro de 2010

Doações abastecem mercado informal no Haiti

Jornal do Brasil

PORTO PRÍNCIPE - Os mesmos sacos de arroz que são distribuídos pela ONU a mulheres haitianas, guardiães da ajuda alimentar, já começam a abastecer o comércio informal, facilitando o ressurgimento de uma das características mais onipresentes da economia de Porto Príncipe. A poucas quadras dos centros de distribuição, ambulantes passaram a vender abertamente arroz retirado de sacos carimbados com a bandeira de países doadores.
Por outro lado, já não se vê mais o caos e a violência que prevaleciam durante a entrega de alimentos nos primeiros dias após o terremoto, quando soldados muitas vezes precisavam recorrer a bombas de gás lacrimogêneo para conter multidões de famintos.
Para garantir uma distribuição mais ordenada, os doadores internacionais iniciaram um sistema no qual soldados entregam sacos de ajuda apenas a mulheres que lhes apresentem cartões de racionamento. Mas até mesmo os cartões já são vendidos por supostos comerciantes. Apesar de a distribuição ter ficado mais calma, a nova política não impediu a ajuda alimentar de cair nas mãos dos vendedores ambulantes.
Em um dos bairros mais pobres de Porto Príncipe, onde hoje vivem 12 mil pessoas em barracas improvisadas, homens vendem xícaras do arroz doado por cerca de 22 gourdes (US$ 0,55).
Aparentemente conformado, o porta-voz do Programa Mundial de Alimentos, Marcus Prior, disse que era “inevitável” que parte dos alimentos doados acabasse sendo vendido.
– Ainda é cedo para dizer quanto acaba chegando ao mercado negro. Nunca gostamos de ver isso acontecendo – lamentou Prior à Reuters. – O objetivo da ajuda é estabilizar a situação alimentícia na cidade.
Ineficiência
O comércio clandestino se aproveita do fato de algumas vítimas do terremoto não terem noção do que é preciso fazer para conseguir alimentos, principalmente depois que foi implantado o novo sistema de distribuição.
– Não chegou comida alguma aqui – reclamou Losin Fritz, líder comunitário que vive em uma das barracas improvisadas na capital, feitas de paus e plástico transparente. – Sabemos que estão usando os cartões de racionamento, mas não sabemos como conseguir esses cartões.
Apesar das dificuldades, grupos de assistência internacionais defendem o sistema de cupons e dizem que aprenderam com os erros cometidos em situações semelhantes anteriores, em que homens mais fortes empurravam mulheres e idosos, para serem os primeiros a receber os alimentos.
Americanos são indiciados por tráfico de crianças
Os dez missionários americanos detidos no Haiti foram indiciados quinta-feira por sequestro de menores e formação de quadrilha, depois de tentarem retirar do país 33 crianças sobreviventes, entre as quais pelo menos um terço não é sequer órfã.
O subprocurador Jean Ferge Joseph anunciou que o caso foi encaminhado para um juiz, que pode libertá-los ou decidir que eles enfrentarão julgamento no país.
Os missionários batistas – cinco homens e cinco mulheres – negam qualquer crime, especialmente de tráfico infantil, e alegam que estavam tentando apenas ajudar crianças que ficaram órfãs no terremoto. Eles foram detidos quando tentavam atravessar a fronteira com a vizinha República Dominicana levando as crianças, que não possuíam documentos.
A polícia haitiana disse que alguns pais admitiram ter entregue seus filhos aos missionários por acreditarem que as crianças teriam educação e uma vida melhor no exterior.
Ants de saber do indiciamento, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, já havia se manifestado em tom de condenação aos missionários.
– Foi lamentável, qualquer que tenha sido a motivação, que este grupo de americanos tenha assumido as coisas com as próprias mãos – disse Hillary.
Bombeiros brasileiros lembram resgates e traumas na capital
Um grupo de militares do Corpo de Bombeiros de Brasília voltou quinta-feira do Haiti depois de passar quase três semanas prestando ajuda humanitária na capital, Porto Príncipe. Recuperados do choque de terem vivido uma verdadeira situação de guerra no país devastado, os bombeiros relataram com orgulho o salvamento de uma espanhola presa nos escombros e o resgate do corpo de uma brasileira soterrada.
Um dos mais experientes na equipe, o tenente-coronel Rogério Alvarenga, lembrou o momento em que deparou com o pai da brasileira, sozinho, escavando os escombros em busca da filha. Já no resgate da espanhola, nas ruínas de um hotel, soldados brasileiros trabalharam lado a lado com colombianos, espanhois e peruanos.
– O país não tem nada, infraestrutura nenhuma. Quando chegamos, percebemos realmente a necessidade das equipes de resgate – destacou.
O primeiro-sargento Kléber Alves dos Santos, explicou que o maior choque foi dar-se conta de que não havia um grupo de pessoas e sim um país inteiro precisando de auxílio.
– Nossa equipe foi treinada para resgatar vítimas em escombros. Nosso treinamento é limitado e quando encontramos uma situação com quilômetros de ruínas e odores pela cidade, é muito chocante – desabafou.

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